Já que a folga nos permite vamos
filosofar.
Dia desses publiquei um artigo em meu
site literário enfatizando sobre a relevância de um cumprimento.
Sei que todos nossos internautas acham
importante um cumprimento. Por isso, partilhando dessa premissa, faço registrar
a seguinte reflexão:
O VALOR DE UM CUMPRIMENTO
Conta-se que um
cidadão bem sucedido, sabedor que sua vida abastada não lhe permitiria achar a
verdade nas pessoas, em face da sua boa condição financeira que, na maioria das
vezes, impede de se saber quem verdadeiramente o estima, resolveu escolher certa
estação do ano para fazer uma metamorfose da sua vida, transformando-se (aos olhos
das pessoas em geral) em um cidadão simples do povo. Incorporou a identidade de
um trabalhador qualquer de rua – um gari. Queria estar presente no meio das
pessoas, nos logradouros urbanos, para vicejar a graciosidade de quem lhe fosse
humano e deparar com a crueldade da indiferença daqueles que não enxergam um
palmo além da sua mesquinhez.
Essa
experiência levou esse cidadão a inúmeras perplexidades. Ele conta que às vezes
chegava a esbarrar nas pessoas para ver se eles o notavam, mas nem sequer eram
capazes de esboçar uma reação (fosse para uma repulsa ou para um resquício de
atenção). Muitas vezes ele era um ser invisível que perambulava pelas ruas,
pois todos passavam por ele e nem sequer o olhavam como um ser humano ou como
alguém importante na sua profissão, já que para muitos limpar a rua é serviço
para os excluídos da sociedade.
A indiferença é
um grau de nossa liberdade, pois somos nós que escolhemos ser indiferentes.
Agimos dessa forma porque nos afastamos da responsabilidade de questionar as
razões para que algumas pessoas possam ser tão desfavorecidas pela vida. Disse
o pensador GABRIEL MARCEL: “Descartes já o tinha percebido com uma
admirável clareza: A liberdade da indiferença é o grau mais baixo da
liberdade”.
É cruel
sabermos que tantos já lutaram por liberdade, mas ainda muitos não sabem usá-la
como devem. Ter liberdade não é sermos únicos. Ninguém consegue ser único.
Assim, é natural escolhermos a quem podemos estar próximos. Na maioria das
vezes cedemos esse espaço a alguém que possa nos oferecer poder, ou a alguém
que se torne verdadeiro puxa o saco e que possa satisfazer nosso ego. Não
percebemos que ninguém é superior. Existem pessoas mais evoluídas, mais sábias,
mais educadas, mais polidas, mas também existem pessoas mais ignorantes, mais
metidas, mais interesseiras, mais egocentristas. Essa ciranda é uma constante
em nossa vida, por isso temos de administrá-la com sapiência para não nos
tornarmos indiferentes.
Ouviu-se,
alhures, que em uma empresa determinada funcionária mais humilde disse o
seguinte: - Esse Presidente não me cumprimenta e não me vê passando no corredor
(quando cruza por mim) mesmo que eu dê pulos em sua frente!. Evidente
que essa colega não está querendo aparecer ou algo do gênero. O que ela
realmente deseja é ser notada como ser humano, como funcionária, afinal um
cumprimento é uma coisa tão simples que pode ser dado a qualquer um que
enxergamos na rua, sem que isso possa ser considerado um gesto incomum.
Por essas e
tantas outras posturas é que o pensador DAVID SALLEVY já disse: “A
rua é mãe de muitas crianças; o lixo é o berço de muitos bebês; nossa
indiferença, o infanticídio”. Isso quer dizer que “não estamos nem aí”
com os problemas dos outros, mormente quando se trata de uma questão social,
pois sempre nos vem a ideia de que são os governantes os responsáveis por essas
mazelas da vida. No mesmo esteio de pensamento disse ainda o pensador acima
citado: “A maior solidão é aquela que se dá não pela ausência de pessoas, mas
pela indiferença da presença delas”.
Esses
pensamentos não são atributos apenas de um pensador que tem o dom de criar
frases de impacto. Eles também estão presentes nas noções elementares de vida
que cada um de nós tem em nosso íntimo, pois, afinal, temos consciência de que
nosso meio social é carente de atenção e precisa de um pouquinho de nossa ajuda
para se tornar mais humano e mais digno para as pessoas como um todo.
Assim, nunca é
demais andarmos atentos pelas ruas e olharmos com um pouco mais de atenção os
nossos semelhantes, até porque quando estivermos exercitando essa conduta
aprenderemos a valorizar um pouco mais a nossa própria condição de vida, pois
certamente iremos enxergar todo tipo de injustiça e de solidão.
Eu creio muito
que determinados acontecimentos que fogem de nossa sondagem, como as tragédias
coletivas, ou os fenômenos naturais, são desígnios de Deus para que possamos
valorizar um pouco mais o que temos, porque não raras vezes nos vemos
criticando a nossa vida miserável, porque não somos capazes de enxergar que na
verdade são os outros que vivem em condições desumanas e não nós que temos um
emprego, temos saúde, temos uma família, não passamos frio, etc. etc.
Destarte, creio
que não é nada demais cumprimentar alguém que passe a nosso lado,
principalmente quando estivermos num ambiente de trabalho, posto que todos que
ali estão (independente do que fazem) representam o preenchimento de uma
necessidade básica da estrutura como um todo.
É triste quando
a gente chega ao trabalho e nossa mesa está suja. Alguns reclamam que o serviço
de limpeza não está eficiente. Mas se esquecem de que em outros dias a sua mesa
estava limpinha. Isso quer dizer que alguém está doente ou faltou por alguma
razão de relevância. Além do que, o episódio serve para nos mostrar quão
importante é o serviço de limpeza.
Essa
constatação permite o entendimento de que todos os setores de uma grande
empresa são necessários e importantes. É verdade que há uma diferença de
capacidade e de atuação, entretanto, num grande prédio mesmo que a parte
superior seja a mais bonita e mais luxuosa, ela não existiria se não fosse a sua
base calcada em grandes colunas que lhe dão sustentação.